Uma oração por Irene

 

Irene, amiga desde 1962, faleceu vítima de dois canceres (diferentes) no pulmão.  Aos que acreditam, peço uma oração; aos que não acreditam, um pensamento positivo.

Obrigado

Avanços na sobrevivência de cânceres

As notícias vindas do Reino Unido são boas, mas não ótimas. Houve um avanço considerável na sobrevivência (dez anos depois do diagnóstico) dos adultos em alguns cânceres nos quarenta anos de 1971-2 a 2010-11, melhorias em outros e quase estagnação em alguns nos quais a ciência ainda não encontrou o caminho, particularmente os do pulmão e do pâncreas. Houve pouco progresso no tratamento de cânceres do esôfago, do estomago e do cérebro. Do lado bom da escala, a sobrevivência do câncer dos testículos está próxima de cem por cento (98%), um avanço bem-vindo desde os 69% de quatro décadas atrás. O temível melanoma está sendo domado: a sobrevivência aos dez anos deu um salto, de 46% para 89%.

No conjunto, metade dos cancerosos sobrevive dez anos ou mais. Dez anos depois do diagnóstico, metade está viva. É um avanço: na média, entre os que foram diagnosticados no início da década de 70, somente um quarto estava viva depois. Um câncer que obteve um aumento substancial na sobrevivência foi o de mama, graças em parte considerável à mobilização e à politização das mulheres: de 40% para 78%. Aliás, as mulheres se beneficiaram mais das melhorias do que os homens: das diagnosticadas (de todos os cânceres) recentemente, 54% devem sobreviver, pelo menos, dez anos, bem mais do que os 46% dos homens. Parte da diferença se explica pelo fato de que os homens continuam a fumar e beber mais do que as mulheres. Em 1974, 51% dos homens adultos britânicos fumavam, dez por cento a mais do que as mulheres adultas. Em 2012, essas percentagens eram de 22 e 19, respectivamente (Fonte: http://www.ash.org.uk). Não tenho dúvidas de que a redução no fumo contribuiu muito para a redução da mortalidade por câncer. Infelizmente, o quadro do consumo de bebidas alcoólicas não é positivo: aumentou de 1974 a 2013, a despeito de uma redução a partir de 2004. Tomando a Inglaterra em separado, pesquisa feita em 2011 revelou que 39% dos homens e 28% das mulheres tinham bebido mais do que o nível máximo recomendado. Esse nível é mais alto no caso dos homens, o que significa que as diferenças absolutas no consumo de álcool entre os sexos é ainda maior. Há vários cânceres com relações com o consumo excessivo de álcool.

E o câncer da próstata? Os dados mostram que 94% estavam vivos um ano depois do diagnóstico, 85% cinco anos depois e 84% dez anos depois. Avançou muito em relação a outros cânceres: entre os diagnosticados no início da década de setenta, havia seis cânceres com melhor sobrevivência (entre os individualizados no gráfico abaixo), mas a projeção a respeito dos diagnosticados quarenta anos depois é que somente os diagnosticados com câncer testicular e com melanoma terão sobrevivência maior aos dez anos.
Esses são os dados britânicos. A sobrevivência é mais alta nos Estados Unidos e deve
[i] ser muito mais baixa no Brasil. Nossa saúde pública deixa muitíssimo a desejar.

O objetivo de todo departamento da ciência médica é, claro, a cura. Até agora, temos tido avanços graduais e cumulativos, como é o caso do câncer da próstata, ou grandes avanços devido a inovações no tratamento.

 

 

 

clip_image001clip_image002

Ver: Adult 10-year net survival, England & Wales Credit: Cancer Research UK


[i] Os dados brasileiros são pouco confiáveis.

CONFIRMADO: MDV3100 AUMENTA A ESPERANÇA DE VIDA EM 37%

Nova pesquisa confirma os benefícios da enzalutamida. Até agora, ela tem sido usada depois que os demais tratamentos deixam de funcionar. Não obstante, eventualmente poderá ser usada em outros estágios da doença, o que também requer aprovação da FDA. Um conhecido pesquisador, Howard Scher, do Memorial Sloan Kettering Cancer Center dirigiu a pesquisa, que coletou dados de quase mil e duzentos pacientes em vários países.

Quais os resultados?

Em comparação com o Grupo Controle, que não tomou medicamento, os que tomaram a enzalutamida – na média – viveram 37% mais tempo. O Grupo Controle viveu, na média, 13,6 meses e o que tomou o medicamento viveu 18,4 meses, um ganho de quase cinco meses. Nessa idade, viver um ano e meio não é tão pouco quanto parece; nesse estágio avançado do câncer, é lucro e lucro considerável.

Mais boas notícias?

Há. Os efeitos colaterais são limitados.

Algo negativo? Há: o custo. A empresa, Medivation, quer recuperar rápido o que investiu nas pesquisas que já duram vários anos e mensalmente custará seis mil dólares. Para ganhar os quatro meses de vida teremos que pagar mais de cento e dez mil dólares. Claro, a exclusividade da fabricação e renda dura um tempo e depois aparecem – legalmente – os genéricos de qualidade semelhante. Porém, até lá muitos dos que se beneficiariam desse medicamento HOJE já não estarão vivos.

Vale a pena. Como política pública, certamente não. Com esses recursos salvaremos mais vidas com outras aplicações. Porém, como diz o Scher, se se trata da sua vida, certamente vale a pena.

GLÁUCIO SOARES                                           IESP/UERJ

Um teste mais exato para os pacientes que removeram cirurgicamente a próstata

Há 25 anos, quando o PSA foi usado pela primeira vez, a acuidade do diagnóstico do câncer da próstata deu um grande salto para melhor. Juntamente com o toque retal, reduziu muito os erros, tanto os falsos positivos (o teste conclui que há câncer quando não há) quanto os falsos negativos (o teste conclui que não há câncer, quando há). Com o correr do tempo, foram descobertas novas aplicações e novas falhas. Em anos recentes, o preço pago por pacientes erroneamente diagnosticados passou a ser conhecido – tanto os falsos positivos e falsos negativos, quanto os de câncer indolente no qual não seria preciso, nem se deveria, mexer. Entraram no tabuleiro as peças da qualidade de vida, que é muito afetada por um diagnóstico positivo, e dos efeitos  colaterais dos tratamentos. 
Tornava-se, portanto, mais importante do que anteriormente, o diagnóstico preciso.  
A Metamark Genetics, Inc., uma empresa dedicada à oncologia molecular e à exatidão dos diagnósticos, parece estar dando importante passo nessa direção. Pesquisaram 500 pacientes, usando um teste de 4 proteínas. Ding e associados mostraram erros muito menores do que os atuais sobre quais os pacientes que experimentam fracasso bioquímico (a volta do PSA) e quais os que morrem após a cirurgia. 
Diagnósticos e prognósticos precisos são fundamentais para os pacientes. Não é apenas a vida dos pacientes que depende deles, mas a qualidade da vida também. 
Esse teste se baseia na análise do tecido das próstatas removidas pela cirurgia. Não é tão prático quando o PSA, que é um simples exame de sangue, baseando-se no exame exaustivo das próstatas removidas dos pacientes. Por isso, só se aplica com essa precisão aos pacientes que passaram pela prostatectomia radical.
O artigo original foi publicado em Nature.

GLÁUCIO ARY DILLON SOARES      IESP/UERJ

Quanto custa a hegemonia militar?

A hegemonia militar tem preço. Não sai barato. Os Estados Unidos gastaram, em 2010, 698 bilhões de dólares com os militares, a preços constantes de 2009.

Isso é muito ou pouco? O leitor pode responder a essa pergunta, de posse de alguns dados. Quem levanta, confere e organiza esses dados? Várias agências, mas talvez a mais confiável seja a SIPRI, localizada em Estocolmo. De acordo com o SIPRI, o segundo colocado nos gastos é a China, com 114 bilhões. Ou seja, menos de seis vezes. Mesmo assim, a China também gasta muito, em cifras absolutas: aproximadamente o dobro da França, o terceiro país mais gastador, exatamente o dobro do Reino Unido e mais do dobro da Rússia, outrora parte central da poderosa, ameaçadora e, comparativamente, pobre União Soviética.

Depois dos Estados Unidos, os dez países que mais gastam, em termos absolutos (sempre em dólares constantes de 2009), são a China, a França, o Reino Unido, a Rússia, o Japão, a Alemanha, a Itália, a Arábia Saudita, a Índia e…o nosso Brasil. Gastamos mais do que a Coréia do Sul, o Canadá, a Espanha…

Pois bem, esses dez países (inclusive a China), somados, representam 523 bilhões de dólares, menos do que os Estados Unidos. Gastam 75% do que os Estados Unidos gastam. 

Como se paga a hegemonia militar? Todos os anos ela custa quase 5% do PIB. Noutros países desenvolvidos ela pesa menos: de 1% no Japão a 2,7% no Reino Unido.

Ela se paga, parcialmente, aumentando a dívida pública e, também parcialmente, reduzindo outros gastos, alguns considerados mais importantes. Mas isso tem custos.

Dia 5, o crédito do governo dos Estados Unidos baixou, pela primeira vez na história, de AAA para AA+. É um sistema usado pela Standard & Poor’s e a baixa não quer dizer que os Estados Unidos não pagarão suas dívidas. Em parte o problema é político, porque a rolagem, que era quase automática, só foi aprovada na última hora, numa jogada claramente política. Mas o problema existe.

A dívida pública não nasceu com Obama; ela aumentou nas guerras mundiais e foi gradualmente reduzida depois. Como percentagem do PIB, a dívida cresceu aceleradamente nas décadas de 80 e 90: triplicou entre 1980 e 1990. A Guerra Fria foi um das causas. Diminuiu quando ela terminou e voltou a crescer. Em 2008, a dívida pública tinha chegado a US $ 10, 3trilhões, ou dez vezes o nível de 1980. O crescimento da dívida fez com que um teto fosse aprovado, mas passou a ser mudado de acordo com as conveniências – todos os anos e sem problemas. Esse ano foi negociado e renegociado, com intenções que, para mim, são claramente eleitoreiras.

Há outros custos, no meu entender, muito maiores, medidos em anos de vida perdidos e em sofrimento.

O NIH é, de longe, a maior financiadora de pesquisas na área da saúde. Podemos ler no site do NIH: “o NIH investe… US $32,2 bilhões anualmente na pesquisa médica para o povo americano.” Menos de sete por cento do que gastam anualmente com as Forças Armadas.

A sobrevivência tem aumentado gradualmente


Tomemos o câncer, o segundo maior assassino da população americana, como exemplo: nos Estados Unidos, o National Cancer Institute (NCI), parte dos National Institutes of Health and the Department of Health and Human Services coordena muitas pesquisas sobre o câncer e uma das instituições que, no setor público, financiam pesquisas sobre o câncer.

O NCI gasta pouco menos de cinco bilhões por ano com pesquisas sobre o câncer, ou 0,7% dos gastos militares. Isso significa que os gastos militares de um ano equivalem aos gastos com pesquisas sobre câncer do NCI durante 170 anos. O orçamento anual do NCI é da mesma ordem de grandeza da construção de um porta-aviões, o Ronald Reagan.
Nos Estados Unidos, aproximadamente mil e quinhentas pessoas morrem de câncer todos os dias; por ano são perto de 570 mil pessoas – mais de meio milhão. Em toda a guerra do Iraque até o dia 18 de julho recente, morreram em combate 3.529 soldados americanos. O equivalente a pouco mais de dois dias do número de mortes de cancerosos nos Estados Unidos, onde uma em cada quatro pessoas deverá morrer de câncer.

Pesquisa e tratamento ajudam! Em 1975/77, de cada cem pessoas diagnosticadas com câncer, cinqüenta estavam vivas cinco anos mais tarde; mas entre os diagnosticados entre 1998 e 2005, 68% estavam vivos cinco anos depois. Um ganho de 13% em um quarto de século. Milhões de vidas. Quantos sobreviveriam se houvesse um corte de dez por cento nos gastos militares, e esses recursos (quase 70 bilhões de dólares anuais) fossem transferidos para a pesquisa, prevenção e tratamento do câncer? Afinal, estaríamos gastando quatorze vezes mais, todos os anos. O meu chute: em dez anos, vários cânceres estariam na categoria de doenças crônicas e muitos outros teriam uma cura bem mais fácil do que agora. Milhões de vidas americanas seriam salvas em uma década. É, ser potência custa caro! Em vidas humanas também.



GLÁUCIO SOARES IESP/UERJ

Aspirina contra o câncer da próstata

Um interessante comentário do Fox Chase Cancer Center, uma instituição de referência mundial, mostra a relevância da aspirina para o câncer da próstata. Começa afirmando que muitos estudos demonstraram que o uso sistemático de pequenas doses diárias de aspirina reduzem a “volta do PSA”, o fracasso bioquímico. Agora, uma pesquisa com Mark Buyyounouski à cabeça, examinou o que aconteceu com dois mil pacientes que fizeram radioterapia no Fox Chase entre 1989 e 2006, descobrindo que os que usaram aspirina tinham um risco mais baixo de que o câncer voltasse. Entre os 761 que tomaram regularmente aspirina um número menor apresentou o fracasso bioquímico, a “volta” do PSA em relação aos 1380 que não tomaram aspirina. Dez anos depois da radioterapia 31% dos que tomaram aspirina tiveram o fracasso bioquímico, menos do que os 39% dos que não usaram aspirina. A diferença parece pequena, mas é estatisticamente significante (p: 0,0005). Se os que não tomaram tivessem tomado, 110 pacientes não teriam experimentado a desagradável volta do PSA, pelo menos até aquela data.

Há outros benefícios, cruciais: aos dez anos, 2% de mortes a menos devidas ao câncer. Vinte e oito vidas salvas até dez anos. Como muitas das mortes por este câncer ocorrem depois de dez anos, o período de observação tem que ser ampliado.

Como pequenas doses de aspirina também reduzem a chance de problemas cardio-vasculares, muitos a consideram um medicamento desejável, de baixo custo e pequenos efeitos positivos em muitas áreas da saúde.

Para falar com as pessoas associadas com essa pesquisa e com a própria instituição, telefonar para Diana Quattrone
Diana.Quattrone@fccc.edu     1-215-728-7784 begin_of_the_skype_highlighting            1-215-728-7784      end_of_the_skype_highlighting
ou, institucionalmente, com

1-888-FOX-CHASE begin_of_the_skype_highlighting            1-888-FOX-CHASE      end_of_the_skype_highlighting ou –1-888-369-2427 begin_of_the_skype_highlighting            1-888-369-2427      end_of_the_skype_highlighting

GLÁUCIO SOARES, com base em informações divulgadas pela própria instituição.

O RISCO DE NAO ESTAR CURADO DIMINUI SEMPRE MAS NUNCA CHEGA A ZERO

Em muitos cânceres, o consenso é que, após cinco anos sem sintomas nem qualquer indicador, inclusive nos exames, o paciente é considerado curado. Infelizmente, não é o caso do câncer da próstata.

A pesquisa foi realizada em Viena e incluiu quase seis mil pacientes que foram tratados com a prostatectomia radical entre 1985 e 2010. Desses, 728 foram acompanhados por mais de dez anos.

Aos 10 e 15 anos após a prostatectomia, 61% e 52% não tinham tido o fracasso bioquímico, a ”volta” do PSA. Isso significa que 9% receberam a desagradável notícia de que não estavam curados depois de dez anos de exames que resultaram em PSA’s não detectáveis. Esse grupo representava, aproximadamente, a mesma percentagem em cada grupo de risco – baixo, intermediário ou alto – contrariando a hipótese intuitiva de que eram ”restos” de cânceres pouco agressivos que, dado o longo tempo transcorrido, apareceram nos exames de PSA.

Em síntese, como bem disse meu urológo há 16 anos, o tempo transcorrido reduz o risco que nunca atinge zero.

GLÁUCIO SOARES

A VELOCIDADE DO PSA TALVEZ NÃO INDIQUE MUITO

Essa pesquisa abriu um janela de esperança para mim: há um ano, meu PSA começou a crescer rapidamente, isso depois de mais de dez anos de um crescimento moderado que começou cinco anos após a cirurgia. Há dois conceitos, duas fórmulas que medem o crescimento do PSA:

  • Velocidade – que é uma medida simples – quanto ele cresceu em um ano, usualmente medido em ng/ML e
  • PSADT – o tempo que ele leva para dobrar.

O tempo que meu PSA levou para dobrar variou ao longo desses anos, começando com perto de dez meses, chegou a mais de trinta meses (o que é bom) e andou vários anos perto de 15, 16 meses, nível que meu cirurgião definiu como “não é ruim, mas também não é muito bom”. Poucos meses depois dessa consulta verifiquei que o PSA estava dobrando em menos de três meses. Minhas leituras mostravam que quando o PSA crescia tão rápido, a esperança de vida era baixa. Poucos sobravam aos cinco anos e muitos morriam antes de três.

Fui a dois especialistas inteiramente diferentes: um que usa tudo e briga com todos, tem vinculações com a indústria de suplementos, foi chefe de um departamento de oncologia, cobra 450 dólares a meia hora e não aceita plano… A primeira consulta durou mais de duas horas. Saí com um caminhão de suplementos para tomar. O objetivo era amainar a crise para entrar no tratamento anti-hormonal. Aliás, a preparação incluir tudo aquilo que piora com esse tratamento, baseado no Lupron: fortalecer os ossos, baixar a pressão etc. etc.

O outro especialista não era médico: era um senhor hospital, votado ano trás ano como o melhor ou o segundo melhor no tratamento de câncer nos Estados Unidos, o Sloan Kettering Memorial Cancer Center. Fizeram tomografia computarizada (uma variante técnica nova) e a cintilografia óssea. Normalmente, nada aparece antes de que o PSA atinja 10 ng/MLou mais, mas essa combinação teoricamente poderia detectar os cânceres se estivessem crescendo rapidamente e o meu estava. O tratamento seria o mesmo recomendado pelo médico anterior “quinze pílulas preparatórias”, uma injeção de Lupron e outras quinze pílulas. A injeção seria dada de três em três meses, quatro em quatro meses, e surgia uma semestral. Mas a estratégia seria intermitente. Quando o PSA voltasse a subir a um nível que predeterminaríamos, nova injeção. A estratégia intermitente seria apenas marginalmente inferior à contínua e os efeitos colaterais iriam desaparecendo. Mas não deixou muitas esperanças: “um tratamento com benefícios moderados e com efeitos colaterais moderados”. Eu sabia que a mediana das respostas era de dezoito meses apenas. Depois disso o Lupron perdia eficácia.

Os exames não encontraram o câncer em lugar nenhum. No nosso segundo encontro, quatro meses depois, não quis fazer nova tomografia etc.: “a tomografia computarizada despeja no paciente a radiação equivalente a trezentos exames de raio-x e o tratamento é o mesmo.” Continuou sem receitar nada. Quatro meses depois voltei e ficou realmente intrigado: o PSADT tinha aumentado de menos de três para mais de dezoito meses, o que é ótimo – mesmo descontando a queda artificial de 50% provocada pelo Avodart (dutasteride) prescrito pelo primeiro médico. Os demais exames estavam dentro do normal, inclusive os fosfatais, mas feito os descontos, meu PSA andava lá por 13 e eu não tenho próstata. Foi meu filho, biólogo e pesquisador, que recomendou contra. Ele é muito frio e disse: pai, até o fim dessa doença você vai ter muitas consultas. Durante esse tempo não dá para fazer um teste de alto risco várias vezes – sete, oito. Espere enquanto puder.

Assim fiz.

Agora leio os resultados de uma pesquisa que reduzem a significação do PSA como indicador de um câncer agressivo, ainda que enfocado nas etapas iniciais (eu estou numa avançada). O artigo combate as biopsias freqüentes por caras, freqüentemente dolorosas, estimuladas pelos PSAs crescentes.

Nas etapas iniciais, pelo menos, o crescimento do PSA não ajuda muito a definir se o câncer (é) será agressivo ou não. Tomado isoladamente é um bom teste, mas se tomado juntamente com outros, não adiciona conhecimento. Andrew Vickers, do mesmo Memorial Sloan-Kettering Cancer Center em New York, onde eu me trato, concluiu que se conhecermos o primeiro PSA, o toque retal, a história da família, ser mais velho e ser negro, a velocidade do PSA não altera o resultado. Se isso se estender aos níveis mais altos, melhor para mim. O acompanhamento do PSA gera mais ansiedade do que conhecimento, particularmente se ele crescer rapidamente. A velocidade do PSA nesses níveis iniciais não é um bom indicador de se o câncer é agressivo ou não.

GLÁUCIO SOARES

A VELOCIDADE DO PSA TALVEZ NÃO INDIQUE MUITO


Essa pesquisa abriu um janela de esperança para mim: há um ano, meu PSA começou a crescer rapidamente, isso depois de mais de dez anos de um crescimento moderado que começou cinco anos após a cirurgia. Há dois conceitos, duas fórmulas que medem o crescimento do PSA:

  • Velocidade – que é uma medida simples – quanto ele cresceu em um ano, usualmente medido em ng/ML e
  • PSADT – o tempo que ele leva para dobrar.

O tempo que meu PSA levou para dobrar variou ao longo desses anos, começando com perto de dez meses, chegou a mais de trinta meses (o que é bom) e andou vários anos perto de 15, 16 meses, nível que meu cirurgião definiu como “não é ruim, mas também não é muito bom”. Poucos meses depois dessa consulta verifiquei que o PSA estava dobrando em menos de três meses. Minhas leituras mostravam que quando o PSA crescia tão rápido, a esperança de vida era baixa. Poucos sobravam aos cinco anos e muitos morriam antes de três.

Fui a dois especialistas inteiramente diferentes: um que usa tudo e briga com todos, tem vinculações com a indústria de suplementos, foi chefe de um departamento de oncologia, cobra 450 dólares a meia hora e não aceita plano… A primeira consulta durou mais de duas horas. Saí com um caminhão de suplementos para tomar. O objetivo era amainar a crise para entrar no tratamento anti-hormonal. Aliás, a preparação incluir tudo aquilo que piora com esse tratamento, baseado no Lupron: fortalecer os ossos, baixar a pressão etc. etc.

O outro especialista não era médico: era um senhor hospital, votado ano trás ano como o melhor ou o segundo melhor no tratamento de câncer nos Estados Unidos, o Sloan Kettering Memorial Cancer Center. Fizeram tomografia computarizada (uma variante técnica nova) e a cintilografia óssea. Normalmente, nada aparece antes de que o PSA atinja 10 ng/MLou mais, mas essa combinação teoricamente poderia detectar os cânceres se estivessem crescendo rapidamente e o meu estava. O tratamento seria o mesmo recomendado pelo médico anterior “quinze pílulas preparatórias”, uma injeção de Lupron e outras quinze pílulas. A injeção seria dada de três em três meses, quatro em quatro meses, e surgia uma semestral. Mas a estratégia seria intermitente. Quando o PSA voltasse a subir a um nível que predeterminaríamos, nova injeção. A estratégia intermitente seria apenas marginalmente inferior à contínua e os efeitos colaterais iriam desaparecendo. Mas não deixou muitas esperanças: “um tratamento com benefícios moderados e com efeitos colaterais moderados”. Eu sabia que a mediana das respostas era de dezoito meses apenas. Depois disso o Lupron perdia eficácia.

Os exames não encontraram o câncer em lugar nenhum. No nosso segundo encontro, quatro meses depois, não quis fazer nova tomografia etc.: “a tomografia computarizada despeja no paciente a radiação equivalente a trezentos exames de raio-x e o tratamento é o mesmo.” Continuou sem receitar nada. Quatro meses depois voltei e ficou realmente intrigado: o PSADT tinha aumentado de menos de três para mais de dezoito meses, o que é ótimo – mesmo descontando a queda artificial de 50% provocada pelo Avodart (dutasteride) prescrito pelo primeiro médico. Os demais exames estavam dentro do normal, inclusive os fosfatais, mas feito os descontos, meu PSA andava lá por 13 e eu não tenho próstata. Foi meu filho, biólogo e pesquisador, que recomendou contra. Ele é muito frio e disse: pai, até o fim dessa doença você vai ter muitas consultas. Durante esse tempo não dá para fazer um teste de alto risco várias vezes – sete, oito. Espere enquanto puder.

Assim fiz.

Agora leio os resultados de uma pesquisa que reduzem a significação do PSA como indicador de um câncer agressivo, ainda que enfocado nas etapas iniciais (eu estou numa avançada). O artigo combate as biopsias freqüentes por caras, freqüentemente dolorosas, estimuladas pelos PSAs crescentes.

Nas etapas iniciais, pelo menos, o crescimento do PSA não ajuda muito a definir se o câncer (é) será agressivo ou não. Tomado isoladamente é um bom teste, mas se tomado juntamente com outros, não adiciona conhecimento. Andrew Vickers, do mesmo Memorial Sloan-Kettering Cancer Center em New York, onde eu me trato, concluiu que se conhecermos o primeiro PSA, o toque retal, a história da família, ser mais velho e ser negro, a velocidade do PSA não altera o resultado. Se isso se estender aos níveis mais altos, melhor para mim. O acompanhamento do PSA gera mais ansiedade do que conhecimento, particularmente se ele crescer rapidamente. A velocidade do PSA nesses níveis iniciais não é um bom indicador de se o câncer é agressivo ou não.

GLÁUCIO SOARES

Abiraterona em casos extremos: quase quinze meses de sobrevivência

A abiraterona continua sendo testada. Na ESMO, em Milão, seus produtores mostraram resultados positivos. O tempo de vida ganho com o tratamento está diminuindo, mas se sabe mais e mais a respeito.

A pesquisa – Fase III – foi feita com pacientes muito, muito adiantados, que já tinham sido tratados com quimioterapia, à qual não respondiam mais. Um grupo recebeu prednisona mais um placebo e o outro recebeu prednisona e abiraterona. A diferença na sobrevivência média entre os dois grupos foi de quatro meses. No grupo controle, a mediana da sobrevivência foi de 10,9 meses e no experimental (prednisona mais abiraterona) foi de 14,8 meses. Isso significa que, no grupo controle, metade dos pacientes sobreviveu mais de 10,9 meses e metade sobreviveu menos. No grupo experimental (prednisona mais abiraterona) metade sobreviveu mais de 14,8 meses.


Uma característica interessante é que muitos pacientes não foram ajudados pela abiraterona, criando a pergunta de quem, suas características e porquê. As medianas sendo o que são, estamos convictos de que há pacientes que sobreviveram três anos ou mais.

Controlar uma proteína nos dará mais tempo

Na busca da cura do câncer da próstata ou de mecanismos que reduzam significativamente seu crescimento tem seguido vários caminhos. Há dois dados ruins para nós, pacientes:

  1. São centenas de “descobertas” que, promissoras inicialmente, não chegam à Fase III (com muitos pacientes e grupo controle) por cada uma que chega e é aprovada pela FDA;
  2. Usualmente, a pesquisa percorre um caminho longo e leva tempo, usualmente dez anos ou mais, até virar remédio e começar a ajudar pacientes.

Do lado positivo, há, cada vez mais, colaboração entre pesquisadores de disciplinas e especialidades diferentes, gerando um caminhão de possibilidades.

Uma dessas possibilidades se refere a uma proteína, que regula a reprodução de células cancerosas e joga importante papel na transformação de células sãs em células cancerosas. Ela se chama Bmi-1 e, se tudo der certo, jogará um papel importante no controle do avanço do câncer. Essas pesquisas estão sendo feitas na UCLA.

Anteriormente havia sido demonstrado que essa proteína estava associada com cânceres agressivos e com resultados ruins – a morte dos pacientes. A associação estava demonstrada, mas os mecanismos não. Estudando animais ficou claro que a Bmi-1 regula a reprodução das células da próstata “maduras” e em importante função no provocar o câncer e no seu avanço.

Qual a descoberta, afinal de contas? Que inibindo essa proteína se reduz a velocidade do crescimento do câncer, dando tempo a que outros tratamentos façam efeito e, idealmente, que novas e cruciais descobertas sejam feitas. Ganhamos tempo.

Fonte: (online) Dec. 2 in Cell Stem Cell.

Gláucio Soares


Afinal, quanto tempo de vida você tem?

Uma pesquisa levantou a esperança de vida dos pacientes de câncer da próstata. Ela varia com o tratamento e com o tempo.

A prostatectomia (cirurgia) e a radiação são os dois tratamentos iniciais mais comuns. Raramente se opera o paciente quando há evidência de metástase: retirar a próstata não tem como curar um câncer que já espalhou, que já está em outros lugares. Mas não é fácil saber onde está o câncer, se já se metastizou ou não. Na dúvida, usam cirurgia. Muitas vezes combinam o cirurgia e a radiação.

O primeiro grande marcador negativo, de que a coisa não está bem, é a “volta do PSA”, quando o PSA reaparece no sangue. Isso significa que há células cancerosas vivas. O câncer não foi curado e, agora, é incurável. O que não quer dizer que o paciente morrerá dele: a maioria não morre deste câncer mesmo depois do fracasso bioquímico (a volta do PSA). Depende de quê? De várias coisas, entre as quais o tempo e o tipo de tratamento – isso entre as que sofreram a volta do PSA. As outras estão livres, curadas. Quando morrerem não será de câncer da próstata. Uma pesquisa com mais de 600 veteranos de guerra mostra quais as probabilidades, quais os riscos.

A volta do PSA – o temido fracasso bioquímico – ocorreu em 34% a 48% dos pacientes, dependendo do tempo e do tratamento. Uma percentagem maior dos submetidos a radiação (onde havia mais casos avançados) teve o desprazer de lidar com a volta do PSA no sangue.

A tabela abaixo mostra os vários riscos por tempo e por tipo de tratamento:

Fracasso bioquímico e morte devida ao câncer da próstata aos 5-, 10- e 15- anos depois do tratamento inicial.

Tempo

% acumulada em que o PSA voltou depois da cirurgia

Mortalidade por câncer depois da volta do PSA entre os que fizeram cirurgia

% acumulada em que o PSA voltou depois da radiação

Mortalidade por câncer depois da volta do PSA entre os que fizeram radiação

5 anos

34%

3%

35%

11%

10 anos

37%

11%

46%

20%

15anos

37%

21%

48%

42%

Dados tirados dos Archives of Internal Medicine.

O que esses dados nos dizem? Que 5 anos depois da cirurgia, 34% dos operados sofrem o fracasso bioquímico, a volta do PSA nos exames de sangue. Cinco anos depois (dez depois da cirurgia) a percentagem sobe um pouco, para 37%. E parece que não aumenta a partir daí. Olhando a terceira coluna vemos os dados relativos aos que fizeram radiação. São mais altos, ainda que não muito mais altos. Aos cinco anos, 35% (praticamente o mesmo que a cirurgia) sofrem o fracasso bioquímico; dez anos depois da radiação, a percentagem aumenta significativamente, para 46% e quinze anos depois parece estabilizar, com 48%, quase a metade.

Não obstante, nem todos os que enfrentam o fracasso bioquímico morrem do câncer. Em verdade, a maioria morre de outra coisa. Comparem a segunda e a quarta colunas. Cinco anos depois da volta do PSA, somente 3% dos que fizeram cirurgia morreram do câncer. Mais cinco anos e a percentagem aumenta para 11%. Mais cinco anos e a percentagem dobra para 21%. Ou seja, quinze anos depois da volta do PSA entre os que fizeram cirurgia, um em cada cinco morreu do câncer.

Tudo indica que essa percentagem continua crescendo depois dos 15 anos, mas as mortes por outras causas também passam a crescer mais rapidamente em função da idade. Lembrem-se de que falamos de 15 anos depois da volta do PSA, do fracasso bioquímico, e não da cirurgia. A maioria está com 80 ou mais.

No grupo que fez radiação os dados são piores – em parte porque muitos fizeram radiação porque havia evidência de metástase e de que a cirurgia não poderia curá-los. As percentagens dos que morrem da doença – depois da volta do PSA – parece dobrar cada cinco anos: 11%, 20% e 42%.

As pesquisas têm se concentrado nesse grupo mais doente, com doença mais avançada. E terapia hormonal, usualmente seguida de quimio e, mais recentemente, da caríssima vacina Provenge e, em final de desenvolvimento, da abiraterona, vão aumentando a sobrevivência específica do câncer da próstata (mas não de outras mortes): uns estimam em 14 a 18 meses o efeito da terapia hormonal (mais há casos de muitos anos em que o efeito funciona – cinco e mais anos), quatro meses de vida na mediana agregados pela quimio; outros quatro pela Provenge e um tempo mais variável, que pode chegar a mais de oito meses com a abiraterona. E haja dinheiro…

Poucos morrem aos cinco anos. A barra começa a ficar mais pesada aos dez e, principalmente, aos quinze e mais anos, depois da volta do PSA.

Fonte: Uchio EM, Aslan M, Wells CK, Calderone J, John Concato. “Impact of Biochemical Recurrence in Prostate Cancer Among US Veterans.” Archives of Internal Medicine. 2010;170:1390-1395.

Resumo por Gláucio Soares de fontes publicadas na internet.


O entusiasmo dos desesperados

Como é do conhecimento de todos os que são pacientes informados, Provenge, a vacina fabricada pela Dendreon está no mercado. Na mediana, aumenta a vida em quatro meses. Metade dos que a tomam aumenta mais de quatro meses e metade aumenta menos.

Há 15 anos que a Dendreon vinha lutando para obter permissão da FDA para fabricar e vender a vacina, que retira anticorpos de cada paciente, os treina fora do corpo a identificar o câncer da próstata como um inimigo e os injeta de volta no paciente. A aprovação mobilizou milhares de pacientes, que mandaram e-mail, enviaram cartas, fizeram reuniões e muito mais.

Não sai barato. A estimativa anda em 94 mil dólares, 783 dólares por dia de vida que adiciona.

Uma grande virtude da Dendreon consiste em ter insistido quando a competição fazia um boicote pesado e a outra por ser a primeira. Outras virão. Mas os limites são claros: não falamos de cura, nem de uma ampliação de vários anos da vida: quatro meses, apenas.

O entusiasmo dos desesperados

Como é do conhecimento de todos os que são pacientes informados, Provenge, a vacina fabricada pela Dendreon está no mercado. Na mediana, aumenta a vida em quatro meses. Metade dos que a tomam aumenta mais de quatro meses e metade aumenta menos.

Há 15 anos que a Dendreon vinha lutando para obter permissão da FDA para fabricar e vender a vacina, que retira anticorpos de cada paciente, os treina fora do corpo a identificar o câncer da próstata como um inimigo e os injeta de volta no paciente.

Não sai barato. A estimativa anda em 94 mil dólares, 783 dólares por dia de vida que adiciona.

Uma grande virtude da Dendreon consiste em ter insistido quando a competição fazia um boicote pesado e a outra por ser a primeira. Outras virão. Mas os limites são claros: não falamos de cura, nem de uma ampliação de vários anos da vida: quatro meses, apenas.

Qual o custo, para os demais, de uns meses de vida a mais?

Não são noticias e posturas agradáveis para nós idosos e cancerosos. Não obstante, tenho que divulgá-las e temos que pensar a respeito.
Peter Bach, do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, em Nova Iorque acaba de revelar que entre 1990 e 2008 os custos de tratar os cânceres aumentaram de 27 para 90 bilhões de dólares. É um crescimento insustentável. Isso, nos Estados Unidos.
O que o provocou? Mudanças nos tratamentos, em boa parte. Novas técnicas e novos medicamentos são caros. As patentes exclusivas, enquanto duram, garantem um mercado cativo para os fabricantes, que calculam quanto podem cobrar a partir da maximização dos lucros e não dos benefícios e das curas. Esses novos medicamentos, novas técnicas cirúrgicas, inclusive as robóticas, novas técnicas de radiação, aumentaram muito os custos e aumentaram algo, talvez não tanto, os benefícios e as chances de cura.
Em alguns casos, aumentou o número e tipo de pacientes que poderiam ser beneficiados. Pacientes idosos e enfraquecidos que não poderiam suportar algumas das técnicas e medicamentos mais antigos foram os principais beneficiados. As cirurgias ficaram mais exatas, menos radicais; as radioterapias ficaram mais bem guiadas, atingindo mais tumores e menos áreas vizinhas. O mesmo vale para a químio: alguns usos ficaram mais toleráveis e outras drogas que reduzem os efeitos colaterais possibilitaram o tratamento quimioterápico a pacientes antes excluídos. Por exemplo: entre 1991 e 2002, a proporção das pacientes com câncer de mama que usavam químio dobrou, assim como o custo de (e/ou para) cada paciente, atingindo perto de 12 mil dólares.
O envelhecimento da população (e o crescimento das custosas doenças degenerativas) faz com que os países gastem mais e mais com a saúde dos idosos. Em muitos países, parte dos custos é distribuída pelo tempo e de forma privada, através de seguros de saúde de longo prazo, muitos deles institucionais – parcial ou totalmente mantidos por empresas.
No Brasil, a Constituição determinou que a saúde é direito do cidadão e obrigação do estado. Sem limitações. Através de ações judiciais, o acesso a tratamentos caríssimos, de ponta, é obtido e pago pelo estado. Mas, quem realmente recebe o benefício? Quem pode pagar um advogado. E quem, realmente, paga por isso? Os que não têm acesso a advogados. Os pobres. Os excluídos, que ficam mais excluídos. O cacoete estatista do legislador brasileiro esqueceu de que alguém tem que pagar a conta. E o que observamos foi uma mudança na composição dos gastos na saúde, com os tratamentos extremos, cada vez mais caros e pesados, ocupando uma fatia cada vez maior, e o tratamento de “doenças de pobre” e a prevenção perdendo espaço. Os gastos derivados de ações judiciais somente com a aquisição de medicamentos estão explodindo: em 2005 foram R$ 2,5 milhões, em 2006 quase triplicaram, para R$ 7 milhões, dobrando em 2007, para  R$ 15 milhões. Em 2008, somente de Janeiro a Julho, foram R$ 48 milhões, dezenove vezes mais do que em todo o ano de 2005.
Porém, os mais prejudicados são os estados, alguns dos quais gastam perto de dez por cento do orçamento com ações judiciais. São Paulo gasta cerca de 32 milhões de reais mensalmente com essa rubrica, e o Rio Grande do Sul cerca de sete milhões. Boa parte desses gastos se refere a medicamentos ou procedimentos que não são parte dos normalmente oferecidos pelo SUS; no caso de cânceres são tratamentos recém lançados no mercado, vários dos quais não são curativos e somente aumentam a sobrevivência, usualmente por pouco tempo. Evidentemente, esse recurso judicial tem um forte viés de classe, pois poucos são os pobres que têm  conhecimento da sua existência e, por definição, nenhum tem como pagar um advogado do próprio bolso.
Para garantir alguns meses a mais de vida para nós, cancerosos, sacrificamos vários anos de vida de populações mais jovens e mais pobres, que deveriam ser as principais beneficiadas pela saúde pública num sistema preocupado com a justiça social. Muitos dos que usam os tratamentos caros poderiam pagar o custo, em parte ou no todo, do próprio bolso.
Não é justo.

Escrito por Gláucio Soares
Publicado no Correio Braziliense

Informação para um paciente com câncer avançado

Para quem já esgotou os benefícios da terapia hormonal e da químio há dois medicamentos recentes que ampliam a sobrevivência: Provenge (sipuleucel-T), fabricado pela Dendreon e acetato de abiraterona, agora nas mãos da Johnson. Provenge aumentou a sobrevivência aos três anos em 40% – 32% vs. 24% do grupo placebo, o que dá uma diferença de 4,1 meses. Não é muito mas, levando em consideração nossa idade e o estágio da doença tudo é lucro. A Dendreon, se bem me lembro, está fazendo testes abertos a pessoas com esse câncer em estágios diferentes. Convém dar uma olhada no site.

http://www.dendreon.com/

Para tal um conhecimento mínimo de busca na internet e um conhecimento de leitura em Inglês são indispensáveis. Se não souber, busque quem saiba. Perca a vergonha – afinal é o aumento da sua sobrevivência que está em jogo.

Quem chega nos estágios avançados e não tem sintomas, particularmente dores, tem sorte dentro do azar. A maioria tem metástase nos ossos, que é muito dolorosa.

O acetato de abiraterona já pode ser  receitado em alguns lugares da Europa. Também é questão de buscar. O ganho na sobrevivência é maior, embora esteja longe do oba-oba que a mídia lhe atribuiu.

Nenhum dos dois é “cura”. Estamos falando de aumentar a sobrevivência e de atingir o objetivo que é não morrer por causa desta besta, mas de outra causa – morrer com o câncer da próstata, mas não por causa dele.

Da volta do PSA até a metástase e daí até a morte

Tivemos, aqui no Rio de Janeiro, a Maratona Urológica 2009.

Um dos trabalhos apresentados é de interesse para muitos de nós, inclusive meu, pessoalmente. A apresentação Treatment of a rising PSA after radical prostatectomy confirmou muitos dados bem conhecidos. O primeiro se refere a que a maioria dos pacientes com um PSA que cresce não morre do câncer da próstata. Segundo o expositor, a primeira medida deve ser a radioterapia cuja eficiência é maior se aplicada antes do PSA superar 0,6 ng/ml.  O autor se preocupa com a qualidade da vida dos pacientes.

Do momento em que o PSA deixa de ser não detectável – “volta” – a mediana até o aparecimento da primeira metástase é de sete anos. Lembro que mediana significa que a metade dos pacientes sofre esse baque antes de 7 anos e metade depois de sete anos. Em quem a metástase aparece mais cedo? Não se sabe com certeza, mas o PSADT é um dos fatores mais importantes: se for menos de 3 meses, a metástase aparece entre 1 e 3 anos depois da volta do PSA, mas se for mais do que 15 meses, a mediana pula para entre dez e quinze anos. Além disso, diz o autor, tanto mais longo o PSADT, tanto maior o valor do PSA no momento em que a metástase é constatada pela primeira vez. Da metástase até a morte são mais seis anos. Como o câncer da próstata surge, na maioria dos casos, após, os 60 anos, o leitor só precisa somar: 60, mais 3 a 5 até a volta do PSA, mais dez até o aparecimento da metástase e mais seis até a morte, já são perto de vinte anos e muitos já morreram de outras causas, sobretudo cardiovasculares.

Os cânceres estão sendo diagnosticados mais cedo

Pesquisadores se perguntaram como responderam os pacientes mais jovens ao tratamento contra o câncer da próstata. Usaram um database com homens que tinham de 35 a 74 anos quando foram diagnosticados, num total de 318.774 pacientes. Primeiro, graças aos exames de PSA os homens jovens  (de 55 anos ou menos) aumentaram sua participação de 2,3% para 9%. Cânceres que só seriam diagnosticados mais tarde, quando estivessem mais avançados, foram diagnosticadsos. A mediana da idade dos diagnosticados diminuiu de 72 para 68 anos. Mesmo assim, os mais jovens ainda foram diagnosticados com cânceres confinados. O tratamento seguiu a idade: homens mais velhos ou não receberam tratamento local ou receberam radioterapia em percentagens mais altas do que os jovens. A sobrevivência foi menor entre os mais idosos nos tumores com Escores Gleason intermediários (5 a 7). Porém, entre os cânceres com Gleasons mais altos os mais jovens tinham sobrevivência menor. É uma hipótese que os testes usados não diferenciaram bem entre os cânceres agressivos e que os dos homens mais jovens eram mais agressivos, embora isso não aparecesse nas medidas convencionais.

A idade no diagnóstico continua caíndo, graças aos exames mais frequentes e começados mais cedo, e isso é bom.

Fonte: Cancer. 2009 Jul 1;115(13):2863-71.

As melhorias no tratamento dos cânceres

As pequenas melhorias não entusiasmam tanto quanto as grandes, ainda que salvem mais vidas, assim como os riscos do quotidiano provocam menos medo do que os acontecimentos que acontecem pouco mas matam muitos, como Chernobyl. Em pouco tempo, os mortos no trânsito superaram em número os mortos em Chernobyl.

O câncer é parecido. A abiraterona apareceu muito na media porque prometia a cura (de fato, não é cura, longe disso), mas poucos se impressionam com o fato de que, cada ano mais pessoas são salvas e menos morrem de câncer. Um artigo por Steve Buttry argumenta ao longo desse raciocínio, que não é novo.

Não obstante, houve muito progresso. Ele relata que em meados da década de 70 a mãe da sua esposa e o pai dele descobriram que tinham câncer. Nas décadas de 60 e 70 o grande público acreditava que câncer era sinônimo de morte. De fato, parecia. O pai de Steve foi diagnosticado com câncer da próstata e morreu em um ano; a sogra de Steve foi diagnosticada com câncer no cólon e morreu em três. Hoje, a expectativa de vida das pessoas que são diagnosticadas com esses cânceres é muito, muito maior. O proprio Steve enfrentou um câncer do colon, fez cirurgia e já se passaram dez anos. Ficou atento e, por isso, fez outra para retirar pólipos.
O câncer tem uma dimensão genética e o irmão de Steve também teve câncer na prostata. Porém, as coisas mudaram desde as décadas de 60 e 70: hoje 98% dos pacientes que sofrem desse câncer estão vivinhos cinco anos depois do diagnóstico. O câncer do cólon, antes considerado letalíssimo, também apresentou melhoras na sobrevivência: 64% estão vivos cinco anos depois do diagnóstico. Se fôr diagnosticado antes da metástase, a percentagem sobe para 90%.
Câncer é uma barra: nos Estados Unidos matará, esse ano, entre quinhentas e seiscentas mil pessoas. Porém, mais gente sobrevive ao câncer do que morre dele. A American Cancer Society calcula que haja onze milhões de americanos que tiveram câncer e não morreram. O progresso é muito desigual e alguns cânceres, como o do pâncreas e um dos cânceres do cérebro, o glioblastoma, por exemplo, continuam sendo de altíssima letalidade. Mas a direção é clara: maior sobrevivência.

Resultados de exames e decisoes difíceis

Este ano, no dia 13 de agosto, completarei 14 anos do diagnóstico de câncer da próstata. Era avançado, Gleason 7 (4+3, que é bem pior do que 3+4) e uma perfuraçao da cápsula, mas nao era desesperador. Quatorze anos depois estou aqui, escrevendo para vocês. Como meu conhecimento era quase zero tomei algumas decisoes erradas e tive medos e receios desnecessários. Muitas ansiedades que poderiam ser evitadas com uma conversa mais demorada com o médico ou através de leitura. Por isso, passei a ler e muito sobre essa doença. Senti, em conversa com outros pacientes que sabiam pouco, tinham muitas dúvidas e, o que é pior, a comunicacao com o médico era péssima! Quem vive nos Estados Unidos tem muitas facilidades para localizar, ingressar e participar de redes de apoio, mas no nosso Brasil, na minha opiniao, fomos treinados a depender muito do estado e pouco de nós mesmos.  Com isso, somos vítimas fáceis de autoritarismos, inclusive de médicos. Por isso, criei esse blog, inspirado em outro, criado pela esposa de um paciente (depois viúva dele) de câncer avançado, chamado PSA Rising.

Cinco anos depois da prostatectomia seguida de radioterapia neo-adjuvante (logo depois), o PSA voltou. Eu nao estava curado! Entrei em nova etapa e fui aprendendo que o PSADT (o tempo que o PSA leva para dobrar) era um indicador muito importante de se e quando haveria metástase e de se (e quando) eu morrería da doença. Meu PSA dobrava cada onze meses. Mudei a dieta e o estilo de vida e o tempo foi aumentando, o que é bom. Em duas crises pessoais, o PSADT baixou, o que é ruim. Hummmmm. Ninguém me convence de que nao há relaçao entre crises existenciais, baixas no sistema imune e aumento no risco de desenvolver um câncer.

No meu nível de tratamento, os pacientes se dividem em dois grandes grupos: os que querem fazer logo a terapia hormonal e os que nao querem porque nao gostam nada dos efeitos colaterais e nao estao convencidos dos benefícios de começá-la cedo. Infelizmente, há um terceiro grupo, o maior de todos, que faz o que aquele médico manda e nao participa de decisoes que afetam sua vida e sua qualidade de vida.

O meu PSADT andou baixando nos últimos dois/três anos, o que nao é bom. Andou em mais de dois anos acima de 24 meses e baixou para 15-16 meses, mas os resultados mais recentes colocam o meu PSADT em 19 meses. Esses foram ganhos muito recentes, a partir de uma experiência linda com uma novena a Santa Terezinha do Menino Jesus. Recebi um bouquet de rosas de pessoa que trabalha em casa no meio da novena….e o PSADT que estava baixando aumentou, para 23 meses. Está em 1,9, numa série mais longa.

Decidi esperar mais antes de iniciar a terapia hormonal. Há outras razoes, sendo uma a de que tenho outros problemas de saúde, inclusive uma fibrilaçao atrial muito pesada. Talvez tenha que fazer uma ablaçao cardíaca. O tratamento hormonal äs vezes piora os problemas circulatórios. Saberei se convém ou nao fazer a ablaçao em uma semana.

É isso. Tudo o que pretendo é retomar minha vida, voltar a escrever meus artigos, fazer minhas pesquisas (uma cachaça!), orientar meus pobres alunos,  e fazer o bem e a vontade de Deus.

Esse blog é consultado por pouco mais de 300 pessoas diariamente. Atingiu mais de 500 quando surgiram as notícias sobre a abiraterona. A todas, peço uma oraçao.

um abraço

Gláucio