Bons resultados com a Apalutamida no combate ao câncer da próstata

Há um novo medicamento contra o câncer da próstata, a Apalutamida (ARN-509) sendo testado – até agora com muito sucesso. De acordo com uma pesquisa chamada SPARTAN, a Apalutamida reduz o risco de metástase e de morte em nada menos do que 72%.

Esse medicamento está sendo testado em pacientes que já não respondem aos tratamentos hormonais, mas ainda não há metástases constatadas clinicamente.

Uma comparação mostra que a mediana sem metástase (tempo até a metástase) nessa categoria era de 16,2 meses no grupo placebo e 40,5 meses no grupo apalutamida. Esse grupo recebeu doses diárias de 240 mg de Apalutamida.

Uma diferença muito grande!

Como foi feita essa pesquisa? Com 1.287 pacientes cujo PSA crescia rapidamente, dobrando a cada dez meses ou menos, a despeito da terapia hormonal, mas que não havia metástase detectada pela Tomografia Computarizada ou pelos scans da pélvis, do abdômen, peito e cérebro.

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ


Saiba mais: Small EJ, Saad F, Chowdhury S et al. SPARTAN, a phase 3 double-blind, randomized study of apalutamide (APA) versus placebo (PBO) in patients (pts) with nonmetastatic castration-resistant prostate cancer (nmCRPC). J Clin Oncol 36, 2018 (suppl 6s; abstract 161).

A espiritualidade combate a depressão

As pessoas reagem de maneira muito diferente à iminência da morte. Uma das áreas de nosso interesse é a relação entre o grupo de comportamentos, crenças e atitudes associadas com a religião, por um lado, e o bem-estar psicológico dos pacientes no fim da vida.

Nelson e sua equipe pesquisaram essas relações entre 162 pacientes terminais que padeciam de AIDS e/ou câncer. Examinaram pacientes que já estavam internados em instituições dedicadas a tornar esse período pré-morte o mais confortável possível, sem qualquer aspiração ou tratamento curativo.

Usaram um questionário e escalas padronizadas.

O principal resultado foi uma clara associação negativa entre o bem-estar espiritual e a depressão. Parecem semelhantes, mas uma funciona no espaço do espírito e outra é um transtorno, uma disfunção no domínio da Psicologia e da Psiquiatria. Nessa pesquisa, as dimensões propriamente religiosas não apresentaram uma relação relevante com a depressão.[i]

[i] Christian J. Nelson, Barry Rosenfeld, William Breitbart e Michele Galietta, Spirituality, Religion, and Depression in the Terminally Ill, em Psychosomatics. Volume 43, Issue 3, Maio–Junho de 2002, pgs. 213-220.

Religiosidade, espiritualidade etc. e a saúde física e mental de idosos

Há quase consenso de que a religião, a religiosidade e a espiritualidade “ajudam” a lidar com doenças, particularmente as graves ou as em fase terminal. Koenig, George e Titus estudaram pacientes idosos. A pesquisa é simples: uma enfermeira, treinada para participar da pesquisa, entrevistou 838 pacientes na medida em que eram internados numa instituição médica.[i]

A despeito da dificuldade no desenho da pesquisa, foi aplicado um questionário muito rico na mensuração da religiosidade e conceitos associados – o “bundle” sobre religião. Incluía escalas para medir a participação religiosa, tanto na organização quanto fora dela, a religiosidade “intrínseca”, a religiosidade, avaliada pelo idoso e também por observadores, medidas de espiritualidade (auto avaliada e também avaliada por observadores, e as experiências espirituais do dia a dia. O contexto psicológico e social também foi estudado: sintomas de depressão, o funcionamento cognitivo, o apoio social, a disposição em cooperar, e a saúde física (sempre obedecendo às duas avaliações, externa e do próprio paciente. As tradicionais variáveis sócio demográficas (idade, sexo, raça e educação) também foram incluídas.

O que descobriram?

A religiosidade e a espiritualidade se correlacionavam com maior apoio social, menos sintomas de depressão, as funções cognitivas funcionam melhor e houve menos obstáculos à cooperação com pessoas e grupos.[ii]

Havia, também, relações com a saúde física, mas menos intima do que com a saúde mental.

Evidente, evidencias como essas mostram a utilidade de estimular as funções religiosas e espirituais que os pacientes porventura tiverem como um importante reforço para as terapias convencionais.

[i] Religion, spirituality, and health in medically ill hospitalized older patients, J Am Geriatr Soc. 2004 Apr;52(4):554-62.

[ii] As relações foram estatisticamente significativas, umas no nível de P<.01 e outras no nível de P<.0001.

Estatinas e câncer da próstata

Em meados do ano passado, uma pesquisa feita na Dinamarca reacendeu o debate sobre a relação entre as estatinas e o câncer da próstata. A base de dados se refere a quase 32 mil pacientes diagnosticados entre 1998 e 2011, de 35 a 85 anos de idade.

A novidade desta pesquisa é que ela não se refere à capacidade (ou não) das estatinas de prevenir o câncer, mas a se o seu uso depois do diagnóstico afeta o avanço do câncer.

O acompanhamento começou um ano após o diagnóstico e foi relativamente curto, uma mediana de 2,8 anos (o que, não obstante, significa que metade dos pacientes foram acompanhados por mais do que 2,8 anos). Durante esse período morreram 7.365 homens do câncer da próstata e outros 11.811 de outras causas. Como é uma população com maioria de idosos, as mortes por outras causas são numerosas, sejam cancerosos ou não.

E as estatinas? A definição era simples: se houve duas ou mais receitas feitas após o diagnóstico.

Controlaram fatores óbvios como a idade, o ano do diagnóstico, o escore Gleason, o tipo de tratamento e fatores socioeconômicos. Com esses fatores controlados, os que usaram estatinas tinham um risco de morte por câncer da próstata 17% menor do que os não usuários e um risco de morte por toda e qualquer causa 19% menor.

Os dados também revelam o crescimento do uso de estatinas na Dinamarca: entre os diagnosticados de 1998 a 2001, 4% usaram estatinas durante o primeiro ano pós-diagnóstico; entre os diagnosticados depois, entre 2007 e 2011, 29% usaram estatinas.

Converse com seu oncologista ou urologista.

Signe Benzon Larsen, do Danish Cancer Society Research Center, em Copenhagen, e colegas publicaram a pesquisa no Journal of Clinical Oncology.

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

DECLÍNIO DO PSA DEPOIS DA TERAPIA HORMONAL E SOBREVIVÊNCIA

Na primeira leva de tratamentos do câncer da próstata, o objetivo, claro, é a cura. Cirurgia, radiação e vários outros tratamentos são usados nesse momento, isoladamente ou em combinação. Se, esgotados esses recursos, o câncer não for curado, a maioria dos médicos considera que o câncer não pode mais ser curado. Nos Estados Unidos, essa situação é comunicada como parte de um dever de oficio; além disso, suspeito que os pacientes americanos fuçam a internet mais do que os brasileiros.

Há dois importantes senões nesse momento:

· Isso não quer dizer que os pacientes vão morrer deste câncer. Em verdade, a maioria morre de outras causas;

· Os tratamentos passam a ter outros objetivos, como parar, postergar o avanço do câncer ou reduzir a velocidade desse avanço, reduzir dor e desconforto nos casos mais adiantados etc..

Os tratamentos mudam e dependendo da existência – ou não – de metástase e da agressividade do câncer, muitos pacientes podem ser acompanhados sem tratamentos mais pesados ou invasivos. Caso contrário, um tratamento comum é o hormonal que busca reduzir os níveis de testosterona. O tratamento pode ser “mono”, sozinho ou combinado.

Uma pesquisa recente mostra que a redução do PSA nos sete meses (nada de magico nesse número – poderiam ser seis meses, dez meses etc.) após o inicio do tratamento se correlaciona intimamente com a sobrevivência. Se o PSA baixar a 0,2 ng/mL ou menos as perspectivas são muito melhores se comparadas com os pacientes cujo PSA era de 4 ng/Ml ou mais. O risco de morte era 82% menor. Boa notícia para mim, porque o meu PSA baixou a 0,05 ng/Ml.

Para entender bem o próximo resultado é preciso ter uma noção do que é mediana. Se você ordenar os pacientes de acordo com a sobrevivência, a mediana é o número de meses que separa a metade que viveu menos da metade que viveu mais. A mediana da sobrevivência (em meses) dos que baixaram o PSA a 0,2 ou menos é muito menor do que o grupo cujo PSA ficou em quatro ou mais após sete meses do inicio do tratamento. No grupo com PSA mais alto a mediana da sobrevivência foi 21,6 meses. Metade desses pacientes morreu antes de 21,6 meses do início do tratamento. A outra metade morreu depois ou não havia falecido quando a pesquisa foi encerrada. No grupo cujo PSA, depois de sete meses, estava em 0,2 ou menos, metade morreu antes de 72,8 meses, mais de seis anos, e a outra metade ou morreu depois ou continuava viva quando a pesquisa foi encerrada.

É uma diferença muito grande.

A pesquisa incluiu uma mistura de pacientes que só foram tratados com a terapia hormonal e de pacientes que, além da terapia hormonal, fizeram, também, quimioterapia. Nessa nota comparo, apenas, os que fizeram a monoterapia hormonal.

O artigo foi publicado no Journal of Clinical Oncology.

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

O câncer da próstata “dá” em cachorros?

A função de Piper era discreta, mas importante. Piper estava encarregado de afugentar animais, particularmente pássaros, das imediações das pistas do aeroporto onde trabalhava, em Michigan. Os choques de aviões com pássaros já causaram milhares de quase acidentes e alguns acidentes. A aterrissagem e a decolagem são os dois momentos mais vulneráveis de um vôo. Piper era um segurança exemplar e era amplamente reconhecido no mundo dos treinadíssimos cães de segurança.

Piper morreu na semana passada, depois de lutar durante um ano contra um câncer da próstata. Embora o câncer tivesse sido diagnosticado no início de 2017, Piper trabalhou alegremente até poucos dias antes de morrer. Dez horas por dia.

No Natal ainda estava protegendo os viajantes.

Há uma elaborada mitologia popular sobre esse câncer. Primeiro, não afeta somente seres humanos; também afeta outros mamíferos.

Segundo, embora seja muito mais comum entre idosos, também afeta homens maduros. Em casos raríssimos afeta até crianças. A prevenção é a nossa arma mais eficiente.

Finalmente, não é um produto da civilização contemporânea e de suas contradições. Já foi encontrado nos ossos de múmias multimilenárias. São casos avançados, com metástase óssea. Não são mais frequentes porque a esperança média de vida era inferior às faixas etárias mais vulneráveis ao câncer da próstata.

Piper evitou sustos, ferimentos, possivelmente vidas.

https://www.washingtonpost.com/…/rip-piper-a-heroic-dog-w…/…

https://www.cbsnews.com/…/piper-the-airport-dog-loses-batt…/

https://www.cbsnews.com/…/piper-the-airport-dog-loses-batt…/

RIP Piper, a heroic dog who kept airport runways safe

Two years after the border collie went viral, he chased his last snowy owl from the Michigan airport where he worked.

WASHINGTONPOST.COM

Propina para um ou bolsa para dois milhões?

Vimos, hoje, a notícia a respeito da propina recebida por um funcionário da Receita Federal – a bagatela de 160 milhões. O Globo (G1) que, creio, não pode ser acusado de esquerdista, comunista etc. e tem uma competente equipe de repórteres e de revisores, informa que “Grupo dos irmãos Batista teria pago R$ 160 milhões para agilizar liberação de créditos tributários.” Essa é a propina total, paga ao longo de vários anos, a um fiscal da Receita. A delação foi feita pelos responsáveis pela própria JBS.

Há, da parte da direita mais sectária e mal informada, a impressão de que o Bolsa Família seria um programa caríssimo e muito mal administrado.

Nem um, nem outro.

Em 2015, o custo total do programa foi cerca de 27 bilhões de reais. Um pouco mais de meio por cento do PIB. No mesmo ano, as renúncias fiscais (impostos de que o Estado abriu mão), programas que alguns, ironicamente, chamam de “Bolsa Empresário”, equivaleram a 400 bilhões de reais em 2017. A fonte não é Granma, jornal oficial do PCC (cubano). É, uma vez mais, o insuspeitíssimo G1. Claro que há partes válidas no argumento de que as renuncias fiscais contribuem para combater a recessão etc.

O Bolsa Família tem benefícios; porém, muitos não dispõem dessa informação. É fácil aceitar dois desses: a elevação do nível educacional das crianças das famílias beneficiadas e uma redução dos gastos médicos graças a redução da fome e da desnutrição. E há quem defenda, com dados e seriedade, que o Bolsa Família tem um expressivo efeito multiplicador.

Porem, o meu foco não é esse. Voltemos à noticia de hoje, dos 160 milhões que teriam sido recebidos por um funcionário corrupto da Receita.

Comparemos com o Bolsa Família: quanto recebem os beneficiados? Quem são eles? Quem pode receber?

Busque a informação na Caixa Econômica: para participar, é preciso que a família esteja em situação de pobreza ou de extrema pobreza. As famílias devem ter renda mensal de até R$ 85,00 por pessoa (extremamente pobre) ou que sejam pobres, com renda mensal entre R$ 85,01 e R$ 170,00 por pessoa (pobre).

Se você, que pertence à classe média e mora no Rio de Janeiro (ou cidade equivalente) teve que pedir o almoço por entrega e um refrigerante, você gastou a renda mensal de uma pessoa extremamente pobre. Essa pessoa recebe do PBF aproximadamente a mesma quantidade, 85 reais.

Voltemos ao nosso possível corrupto da receita. Quantas pessoas seriam ajudadas pelo PBF com o que parece que o nosso corrupto recebeu de propina?

Só a propina equivale a 1.882.352 bolsas. Chegando perto de dois milhões de bolsas. Só esse ladrãozinho e seu grupo (se é que, realmente, receberam propina da JBS – tudo sujeito a confirmação) recebeu o equivalente ao benefício anual de 156.863 pessoas paupérrimas.

Essa é a medida da corrupção e das injustiças que elas representam.

Para visualizar melhor, encha o Beira Rio, o Engenhão, o Pacaembu e o Independência com pessoas muito, muito pobres, subnutridas, em andrajos, beneficiários do Bolsa Família. Aquela pessoa, ou aquele grupinho, afanou o equivalente à renda anual de todas essas pessoas.

Se você ainda acredita que o Bolsa Família é o principal erro, um problema dos mais sérios do Brasil, e que a corrupção é coisa pouca…

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

PRESERVANDO O NOSSO CÉREBRO

O cérebro parece um músculo: exercitando-o se desenvolve; deixando parado, se atrofia.

Infelizmente, não é bem assim. Se fosse, os mundos acadêmico e intelectual estariam recheados de atletas olímpicos, cognitivamente falando. Porém, somos todos suscetíveis à demência e ao mal de Alzheimer’s.

O que não quer dizer que exercitar o cérebro seja inútil.

Uma pesquisa, que foi financeiramente apoiada pela Alzheimer’s Society da Grã-Bretanha, mostra que o que chamaram de Cognitive Training (CT), o treinamento cognitivo, pode contribuir para a prevenção da demência e para a manutenção das funções cognitivas em nós, coroas.

Como foi feita essa pesquisa?

Que resultados apresentou?

Primeiro, a pesquisa foi feita online, pela internet. Isso barateou enormemente o seu custo. Imagine como poderia baratear o custo do CT – para milhões de idosos brasileiros!

Seguiram um procedimento padrão: sortearam os participantes, adultos com mais de 50 anos, em três grupos: um foi treinado em Procedimentos Cognitivos Gerais; o segundo em Raciocínio e o terceiro pagou o pato: foi o grupo controle. Não foi treinado em nada. O treinamento durou seis meses e foi feito online.

Qual o objetivo principal? Contribuir para que idosos (mais de 60) tomem conta de suas atividades cotidianas, diárias. Continuem razoavelmente lúcidos e responsáveis por si mesmos.

Porém, os autores são pesquisadores e não perderiam essa oportunidade de avançar o conhecimento em outras áreas. A pesquisa tinha objetivos secundários: ver o efeito sobre o raciocínio, sobre a memoria verbal de curto prazo (essa aterroriza os coroas de verdade, >80 anos). Tem mais: recauchutar a memória funcional espacial, a aprendizagem verbal e a vigilância digital. O numero de coroas cobaias era grande: 2.912 com mais de sessenta. A garotada com mais de cinquenta até sessenta era ainda mais numerosa.

E os resultados?!!!? E os resultados?!!!?

Os pacotes de treinamento ajudam! O pacote geral e o com exercícios de raciocínio ajudaram os coroas de mais de sessenta a enfrentar os problemas do cotidiano. Os ganhos no raciocínio começaram mais cedo, em seis semanas; os outros demoraram mais tempo – seis meses.

Um grupo importante era os que já demonstravam algum declínio associado com a idade. São os gagás – como eu provavelmente já sou.

O que aconteceu com eles???

Aleluia! O Bom Deus não excluiu os gagás! Houve benefícios semelhantes aos obtidos pelos não gagás. Todos os grupos (menos o controle, claro) melhoraram.

Uma conclusão se impõe: o treinamento cognitivo online beneficia os coroas de diversas idades. Dentro de limites, mas beneficia. O maior benefício vem do treinamento no raciocínio.

Uma profecia (fácil!) também se impõe: treinamentos como esses e seus benefícios vão demorar a chegar ao Brasil e firmar raízes no país. Aqui tudo se faz através do estado, povoado em boa parte por analfabetos funcionais dedicados somente a aumentar o seu próprio patrimônio.

GLÁUCIO SOARES IESP/UERJ

.declínio cognitivo,raciocínio,alzheimer’s,demência,treinamento pela internet,memória,aprendizagem verbal

PRESERVANDO O NOSSO CÉREBRO

O cérebro parece um músculo: exercitando-o se desenvolve; deixando parado, se atrofia.

Infelizmente, não é bem assim. Se fosse, os mundos acadêmico e intelectual estariam recheados de atletas olímpicos, cognitivamente falando. Porém, somos todos suscetíveis à demência e ao mal de Alzheimer’s.

O que não quer dizer que exercitar o cérebro seja inútil.

Uma pesquisa, que foi financeiramente apoiada pela Alzheimer’s Society da Grã-Bretanha, mostra que o que chamaram de Cognitive Training (CT), o treinamento cognitivo, pode contribuir para a prevenção da demência e para a manutenção das funções cognitivas em nós, coroas.

Como foi feita essa pesquisa?

Que resultados apresentou?

Primeiro, a pesquisa foi feita online, pela internet. Isso barateou enormemente o seu custo. Imagine como poderia baratear o custo do CT – para milhões de idosos brasileiros!

Seguiram um procedimento padrão: sortearam os participantes, adultos com mais de 50 anos, em três grupos: um foi treinado em Procedimentos Cognitivos Gerais; o segundo em Raciocínio e o terceiro pagou o pato: foi o grupo controle. Não foi treinado em nada. O treinamento durou seis meses e foi feito online.

Qual o objetivo principal? Contribuir para que idosos (mais de 60) tomem conta de suas atividades cotidianas, diárias. Continuem razoavelmente lúcidos e responsáveis por si mesmos.

Porém, os autores são pesquisadores e não perderiam essa oportunidade de avançar o conhecimento em outras áreas. A pesquisa tinha objetivos secundários: ver o efeito sobre o raciocínio, sobre a memoria verbal de curto prazo (essa aterroriza os coroas de verdade, >80 anos). Tem mais: recauchutar a memória funcional espacial, a aprendizagem verbal e a vigilância digital. O numero de coroas cobaias era grande: 2.912 com mais de sessenta. A garotada com mais de cinquenta até sessenta era ainda mais numerosa.

E os resultados?!!!? E os resultados?!!!?

Os pacotes de treinamento ajudam! O pacote geral e o com exercícios de raciocínio ajudaram os coroas de mais de sessenta a enfrentar os problemas do cotidiano. Os ganhos no raciocínio começaram mais cedo, em seis semanas; os outros demoraram mais tempo – seis meses.

Um grupo importante era os que já demonstravam algum declínio associado com a idade. São os gagás – como eu provavelmente já sou.

O que aconteceu com eles???

Aleluia! O Bom Deus não excluiu os gagás! Houve benefícios semelhantes aos obtidos pelos não gagás. Todos os grupos (menos o controle, claro) melhoraram.

Uma conclusão se impõe: o treinamento cognitivo online beneficia os coroas de diversas idades. Dentro de limites, mas beneficia. O maior benefício vem do treinamento no raciocínio.

Uma profecia (fácil!) também se impõe: treinamentos como esses e seus benefícios vão demorar a chegar ao Brasil e firmar raízes no país. Aqui tudo se faz através do estado, povoado em boa parte por analfabetos funcionais dedicados somente a aumentar o seu próprio patrimônio.

GLÁUCIO SOARES IESP/UERJ

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Amendoim faz bem, mas cuidado com o môfo

O amendoim é o primo pobre de um conjunto que inclui nozes, castanhas de caju, castanhas, pinhões, amêndoas, macadâmia, castanhas do Pará, entre outras. As pesquisas sobre dietas e suas consequências são muito difíceis de realizar e os pesquisadores aceitam que os dados não são bons como gostariam. O consumo dessas “nuts” está associado à reduções de mortalidade em diferentes grupos étnicos e grupos com problemas de saúde, como diabéticos, obesos, fumantes e alcoólatras.

Segundo John Day, um cardiologista, ajudam a impedir o entupimento das artérias. Ajudam a baixar o LDL (o colesterol “ruim”). Artérias limpas significam um risco menor de problemas crônicos de saúde.

As pesquisas incluíram grupos muito variados: habitantes do Sudeste de baixa renda, chineses em Shangai etc. Todos os grupos se beneficiam da ingestão desses alimentos, inclusive o amendoim, inclusive a pasta de amendoim, ingrediente típico de sanduiches feitos apressadamente.

Acompanharam mais de duzentas mil pessoas. As mortes por doenças do coração e por derrames eram perto de vinte por cento mais baixas entre os que comiam um pouco dessas “nuts” diariamente, em comparação com os que não os incluíam na sua dieta.

Não obstante, esses alimentos devem ser saudáveis ou aparecem outros riscos. Há fungos que produzem aflatoxinas que estão ligadas a várias doenças, inclusive ao câncer do fígado. São um problema comum em países com baixo nível de higiene alimentar.

Eu, que curto muitas das “nuts”, inclusive amendoim “japonês”, olho para o positivo.

Gláucio Soares

Um teste de urina que poderá salvar vidas, sofrimento e dinheiro

Agora existe, em fase experimental, um teste simples, de urina, que pode ajudar no diagnóstico do câncer da próstata com alta acuidade, acertando em 98% dos casos.

Há dois tipos de erros que usualmente ocorrem no inicio do câncer. O pior não trata canceres que precisam ser tratados. Sem testes, é uma possibilidade real e uma ocorrência comum porque os sintomas que são perceptíveis pelos próprios pacientes só surgem quando o câncer está avançado.

O erro oposto tem a ver com diagnosticar e tratar invasivamente um câncer da próstata que não é agressivo, que não matará nem afetará a vida do paciente.

Quando o teste de PSA e o toque retal não excluem a possibilidade de câncer, o próximo passo é a biópsia, com agulhas, um procedimento claramente invasivo.

Precisamos de avanços e progresso nesse nível também, e não apenas nos níveis avançados do câncer.

Esse novo teste de urina pode evitar 4 em cada dez biópsias. Dificilmente há falsos positivos nas biopsias, mas ainda hoje há falsos negativos. O câncer está numa área que escapou às agulhas etc.

Esse teste, chamado SelectMDx, ainda está em desenvolvimento no Radboud University Medical Centre, na Holanda. Se confirmar as promessas, evitará muita dor, física e psicológica, para futuros possíveis pacientes.

Gláucio Soares IESP-UERJ

Espiritualidade, religião e depressão entre pacientes terminais

A depressão é comum entre pacientes terminais, com pouco tempo de vida. Nesse grupo de pessoas, há muita tristeza, muita desesperança. Nesse grupo, ter ou não ter uma vida espiritual e ter ou não ter uma religião fazem muita diferença. Uma pesquisa, publicada há quinze anos, analisou os efeitos da religião e da espiritualidade sobre pacientes terminais.[i] Eram 162 pacientes com câncer e/ou AIDS, com uma esperança de vida de menos de seis meses. Os pesquisadores usaram medidas padronizadas de alguns conceitos, inclusive a Hamilton Depression Rating Scale (HDRS), que é muito usada nos estudos quantitativos sobre a depressão.

A associação mais intima que encontraram foi entre a espiritualidade[ii] e a depressão: a mais espiritualidade, menos depressão. A espiritualidade alivia muitas pessoas com doenças terminais, no fim da vida delas.

E qual o papel da religião? O impacto da religião sobre a depressão se faz, segundo os autores dessa pesquisa, através da espiritualidade. A equação passa a ter três termos: ter uma religião aumenta a espiritualidade, que reduz a depressão.

Gláucio Soares            IESP/UERJ


[i] Christian J. Nelson, Barry Rosenfeld, William Breitbart e Michele Galietta, Spirituality, Religion, and Depression in the Terminally Ill, Psychosomatics, Volume 43, Issue 3, May–June 2002, Páginas 213-220.

https://doi.org/10.1176/appi.psy.43.3.213

[ii] Foi usada a FACIT Spiritual Well-Being Scale.

Comparando os efeitos colaterais da enzalutamida e da abiraterona

Temos lido e ouvido muito sobre os benefícios de dois medicamentos relativamente recentes que competem no mercado de pacientes cujo câncer já é resistente aos tratamentos hormonais, a abiraterona e a enzalutamida. Não obstante, há muito pouco a respeito de seus efeitos colaterais. Uma equipe, com a participação de médicos e pesquisadores brasileiros, realizou uma meta-análise para ampliar o conhecimento nessa área. Lembro que a meta-análise inclui instrumentos estatísticos para analisar dados já coletados.

A que conclusões chegaram?

A enzalutamida não está associada com o conjunto de eventos cardiovasculares, graves e não graves, em seu conjunto, ou com eventos cardiovasculares graves (nível ≥3), mas está associada ao risco de fadiga, de todas as intensidades (RR 1.29 – 95% CI 1.15-1.44).

Com a abiraterona, os resultados foram diferentes: aumenta o risco de problemas cardiovasculares, mas não aumenta a fadiga.

Esses resultados mudam a probabilidade de qual tratamento será usado em qualquer caso porque há resistências cruzadas e, depois de usar um desses medicamentos o outro surte pouco efeito.

Informação para nós, pacientes. Converse com seu oncólogo.

Gláucio Soares IESP/UERJ

Saiba mais: leia o artigo em Raphael B Moreira, Marcio Debiasi, Edoardo Francini, Pier V Nuzzo, Guillermo De Velasco, Fernando C Maluf, Andre P Fay, Joaquim Bellmunt, Toni K Choueiri, Fabio A Schutz, em Oncotarget. 2017 Aug 08, versão eletrônica.

Aumentando a eficiência dos tratamentos contra o câncer

Algumas combinações de medicamentos contra o câncer da próstata são bem mais eficientes do que cada medicamento isoladamente.

Algumas, mas não todas. Há casos de resistências cruzadas, nos que a resistência que as células cancerosas adquiriram em relação a um medicamento se aplica, em maior ou menor extensão, a outro ou outros medicamentos.

Uma combinação que tem produzido alguns resultados usa a químio e a radiação em uma faixa definida da onda para ativar terapias chamadas de foto térmicas (minha tradução de photothermal) e foto dinâmicas (minha tradução de photodynamic). São abreviadas como PTT/PDT. Porém, vários medicamentos esbarram em suas propriedades (ou ausência delas), como não serem solúveis em agua, e serem eliminadas rapidamente pelo nosso corpo.

Por isso, pesquisadores buscam, também, tratamentos auxiliares que aumentam a eficácia dos tratamentos primários. Tal parece ser o caso de envolver os medicamentos em albumina – que é uma proteína abundante no plasma sanguíneo.

É o que pesquisadores da Medical School of Nanjing University, na China, estao fazendo. “Embrulham” o PTT/PDT, o docetaxel (químio) e o contraste infra-vermelho (IR780). No meu primitivismo de paciente, gostei de saber que os agentes chamados PPT matam as células cancerosas através do calor; eles são ativados por lasers, atingindo temperaturas mais altas do que a resistência das células. A ideia de fritar ou de escaldar as células cancerosas me agrada imensamente… ainda que não seja exatamente isso o que acontece.

Trabalhando com camundongos, os pesquisadores analisaram as imagens, constatando que, em 48 horas as nanopartículas que desenvolveram se concentraram na região onde está o tumor. Concentrando a radiação nessas áreas, os pesquisadores perceberam que conseguiram estancar o crescimento dos tumores – um resultado que não foi alcançado usando docetaxel ou o PPT isoladamente.

Cresce a pesquisa chinesa.

Bem-vinda!


GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ


Saiba mais: “Self-assembled albumin nanoparticles for combination therapy in prostate cancer,” no International Journal of Nanomedicine.

Nova geração de tratamentos hormonais?

A personalização do tratamento do câncer da próstata já está em curso. Personalização significa que a escolha do tratamento leva em consideração características do paciente, inclusive o estágio e o subtipo do câncer.

A Janssen Biotech, Inc., uma empresa farmacêutica, acaba de submeter um novo tratamento, baseado na apalutamida, que se aplicará somente a pacientes cujo câncer já não responde ao tratamento hormonal, mas ainda não apresentam metástases. É uma fatia importante do mercado.

Até o momento, a Food and Drug Administration (FDA), que é quem concede licença a novos medicamentos nos Estados Unidos, não concedeu nenhuma licença que se aplicasse a pacientes com essas características.

O que justifica esse pedido?

Os resultados de uma pesquisa clínica Fase III, chamada ARN-509-003 (SPARTAN) onde compararam os resultados do grupo experimental, que recebeu a apalutamida, com um grupo controle. A empresa considera que a apalutamida é a “nova geração” de tratamentos hormonais – além da abiraterona e da enzalutamida.

Que efeitos foram usados como critérios? O principal foi a ausência de metástases, mais exatamente o tempo que leva até o aparecimento da primeira metástase. A apalutamida promete uma “esticada” na duração desse estagio da doença, que é melhor (ou menos pior) que o seguinte, quando já há metástase. Dada a correlação entre o tempo até o aparecimento de metástases e o tempo até a morte, é provável que também signifique uma esticada na sobrevivência.

Converse com o seu urologista ou oncologista a respeito.

GLÁUCIO SOARES     IESP-UERJ

Cachorros farejam o câncer na urina

No estado de Indiana, um grupo de pesquisadores, com Dr.Mangilal Argawal à frente, está levando a sério a possibilidade de usar cachorros na detecção do câncer da próstata.

Foram inspirados por uma pesquisa feita na Itália onde os cachorros foram treinados para detectar corretamente o câncer cheirando a urina. Acertaram em 98% dos casos, um resultado muito superior ao de outros testes. As biopsias, custosas, invasivas, frequentemente dolorosas e sujeitas a infecções e outros efeitos colaterais, tem uma taxa incômoda de falsos negativos.

Embora os erros tenham diminuído, ainda existem. Quando eu fiz biopsias os dois primeiros “batches” (um de quatro agulhas, outro de seis) deram resultados negativos. Como o PSA continuava crescendo, foi feita nova série de seis agulhas e o câncer foi encontrado.

O olfato dos cachorros é muito, muito mais poderoso do que o dos humanos. Alexandra Horowitz, que estuda os caninos no Barnard College, afirma que os cachorros podem notar uma colher de açúcar no volume equivalente a duas piscinas. A acuidade seria de partes por trilhão.

Fonte: Inside of a Dog. 384 páginas, ISBN 9781416583431 | September 2010. À venda na Kindle por 13 dólares.

Na minha leitura, há dois grandes problemas no uso sistemático de cachorros na detecção do câncer da próstata: o primeiro é o treinamento. Tudo depende da qualidade e da extensão do treinamento. O segundo é o preconceito. Não vai ser fácil convencer pacientes a depositar as suas fichas em algo tão importante como a detecção de um câncer em um cachorro.

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

Uma luzinha de esperança

Essa é uma luzinha de esperança para quem já passou por todas as etapas do câncer da próstata. Quem são esses pacientes? Aqueles que não respondem mais às terapias já estabelecidas, como docetaxel, cabazitaxel, enzalutamida e abiraterona. Uma empresa chamada Endocyte desenvolve terapias personalizadas, feitas para subgrupos de pacientes com características especificas, e não para todos os pacientes.

Em que consiste a luzinha de esperança?

Em um tratamento com um nome impossível, 177Lu-PSMA-617, que direciona seu poder de fogo para um antígeno vinculado a uma membrana, chamado PSMA. Esse antígeno está presente em cerca de 80% dos pacientes com metástase que não respondem a qualquer tratamento hormonal. O 177Lu-PSMA-617 reduziu o PSA em mais de 50% numa percentagem razoável dos pacientes (de 40% a 60%). Os demais não responderam ao tratamento. Houve melhoria em boa parte do que apresentavam metástases para outros órgãos e redução da dor (muito temida nas metástases ósseas).

A mediana da sobrevivência foi de 12,7 meses.

Esses são resultados com poucos pacientes. São promissores, o que levou ao projeto de uma pesquisa maior, Fase III, prevista para 2018.

Uma luzinha no fim do túnel…

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

Câncer da próstata e estatinas

O câncer da próstata atinge, majoritariamente, pessoas idosas, ainda que tenhamos casos entristecedores de crianças com a doença. Os idosos também são mais afetados por doenças cardiovasculares e enfrentam problemas com o colesterol. Muitos tomam estatinas para controlar o colesterol.

Claro que os pesquisadores se perguntaram: as estatinas afetam o câncer? Se afetam, é para melhor ou para pior?

Parece fácil pesquisar essa relação, mas há possíveis efeitos endógenos: dados os mesmos problemas cardiovasculares, quem toma estatinas, na média, tende a ter mais cuidado com a saúde do que quem não toma, a fazer check-ups mais frequentes, a ir ao médico regularmente e a ter mais recursos monetários, cognitivos e associativos. São pacientes diferentes.

As pesquisas feitas, em sua maioria, foram retrospectivas, e buscaram saber se os pacientes que tomavam estatinas (informação obtida dos próprios pacientes ou, em poucos casos de países com excelente sistema de estatísticas integradas, das receitas médicas) apresentavam um desenvolvimento diferente do câncer.

E os pacientes que passaram a tomar estatinas depois do diagnóstico do câncer? As estatinas ajudaram?

Uma pesquisa realizada na Dinamarca informa que o consumo regular de estatinas possivelmente reduz o risco de morte em 20%. Prudentemente, os pesquisadores dão um passo para trás e afirmam que a associação não demonstra causalidade.

Como foi feita a pesquisa?

Analisaram dados de quase 32 mil dinamarqueses de 35 a 85 anos que foram diagnosticados com um adenocarcinoma da próstata entre 1998 e 2011. Coletaram as informações começando um ano depois do diagnóstico, e organizaram os dados relativos aos 2,8 anos seguintes – na mediana.

O resultado: homens que passaram a usar estatinas depois do diagnóstico tinham um risco 17% menor de morrer daquele câncer e 19% menor de morrer de qualquer causa.

Entre parênteses: confirmando o que já sabíamos, dos 32 mil, 7.365 morreram do câncer e 11.811 de outras causas. Mais pessoas diagnosticadas com câncer da próstata acabam morrendo por outras causas do que devido ao câncer.

Claro que os pesquisadores “controlaram” outros fatores que alteram o risco de morte, começando com a idade do paciente, o ano do diagnóstico, o escore Gleason, um indicador da agressividade do câncer, o tipo de tratamento e fatores socioeconômicos. Controlados esses fatores, concluíram que o uso de estatinas reduziu o risco de morte pelo câncer em 17% e de todas as causas juntas em 19%.

Para fins da pesquisa, usuários de estatinas eram os pacientes que tiveram duas ou mais receitas depois do diagnóstico do câncer, sem contar as receitas do primeiro ano.

Pacientes com diagnóstico precoce e os que fizeram prostatectomia se beneficiaram mais da estatina.

Os pesquisadores e outros “experts” entrevistados concordam em que uma pesquisa maior, com grupos controle, é necessária antes que os médicos comecem a prescrever estatinas para ajudar no tratamento do câncer da próstata. As estatinas também têm efeitos colaterais.

Se você, um parente ou amigo enfrenta um câncer da próstata, consulte seu urologista ou oncologista sobre essa possibilidade. De jeito algum se automedique.

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

Alfred Stepan e a ditadura

Recebi a notícia do falecimento de Alfred Stepan, professor de “government” da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, onde ocupava a cátedra Wallace Sayre. Stepan fundou em Columbia o Centro para o Estudo da Democracia, Tolerância e Religião. Stepan foi, também, um dos estudiosos do regime militar no Brasil. Escreveu Os Militares na Política.

Quase acidentalmente, Stepan também influenciou o que se podia e o que não se podia publicar durante a ditadura. Não se podia publicar nada sobre a desigualdade de renda, que cresceu muito nos anos posteriores ao golpe. Creio que foi o Hoffman que escreveu um artigo acadêmico sobre a desigualdade de renda no Brasil que não podia ser publicado, tal a severidade da censura que afligiu o Brasil durante a longa noite de 21 anos por que passamos.Circulou datilografado, quase como um pergaminho religioso. Em palestra, Stepan, já um renomado professor americano, mencionou a desigualdade de forma veemente e um resultado, bem-vindo e inesperado, foi que passamos a poder estudar e publicar a respeito de algo que estava acontecendo e que afetava muito a vida de dezenas de milhões de brasileiros. Não dava mais para esconder. Mas era proibido publicar. A censura era feroz e imprevisível.

Ironicamente, muitos pesquisadores sentíamos uma solidariedade com os colegas que foram oprimidos por Stalin e sucessores na União Soviética que também eram obrigados a datilografar copias de seus trabalhos e suas pesquisas, circulando-as privadamente entre os colegas para receber críticas e comentários, sempre com receio de que acabassem nas mãos de um espia do regime. Eram os suados samidatz.

Essa mesma censura ainda nos impede saber quanta corrupção havia no regime militar. Os escândalos eclodiam, mas eram rapidamente abafados. Hoje, diante da podridão dos últimos governos, muitas pessoas passaram, erroneamente, a romantizar o regime militar. Não viveram aquela opressão, alimentando-se de contos da carochinha. Os que eram jovens adultos quando a ditadura começou ou já morreram ou estão na Terceira Idade avançada.

Por incrível que pareça, a memoria daquele período de trevas em boa parte se perdeu.

GLÁUCIO SOARES IESP-UERJ

R$ 6,00 restant

A corrupção e o câncer do ovário

Lúcia, dei uma espiada nas estatísticas a respeito do câncer do ovário, conforme pediste. Como esperado, as melhores são as dos países com mais alto nível educacional e mais alta renda, o que introduz um viés quando transferimos conhecimento baseado nas estatísticas desses países para informar a cidadania de países com informação menos confiável.
Nos Estados Unidos, a chance de uma mulher ter câncer do ovário em qualquer momento da sua vida é uma em 75 e de morrer por causa desse câncer é uma em cem.
Entre as que foram diagnosticadas com esse câncer, duas de cada três morrem dele. É um câncer agressivo. Cinco anos depois do diagnóstico, 45% das pacientes estão vivas.
Que fatores aumentam ou diminuem o risco de morrer desse câncer? A idade é um fator importante: as pacientes mais jovens (menos de 65 anos) têm um risco morrer de morrer desse câncer.
A Grã-Bretanha usa um corte etário diferente: mulheres jovens (15 a 39) e não jovens (>40). A sobrevivência aos cinco anos no primeiro grupo é 84%, mas apenas 14% no grupo de idosas (80-89).
Nesse câncer, como em tantos outros, o diagnóstico precoce salva muitas vidas. Se o câncer não tiver metastizado para fora do ovário (estágios IA e IB), 92% das pacientes estão vivas cinco anos depois do diagnóstico. Com um bom sistema de informação, educação e saúde pública, a maioria dos casos poderia ser diagnosticada cedo, mas não é. Nos Estados Unidos somente 15% dos casos são diagnosticados cedo. Imagino que, no Brasil, a percentagem seja ainda mais baixa.
O diagnóstico tardio piora muito as estatísticas e o risco que elas representam: se diagnosticada no estágio IV, a chance de qualquer mulher estar viva cinco anos depois cai para 17%.
Esses dados devem ser tomados com muito cuidado porque há muitas diferenças entre os sistemas educacional, médico, hospitalar e de saúde pública que covariam com a renda per capita.
É mais um exemplo de um câncer cuja mortalidade depende da eficiência do sistema de saúde. Como, no Brasil, uma parte considerável é de gestão pública, a política tem um papel ainda mais relevante.
Reitero que, em se tratando de câncer, os erros podem ser fatais. Todo tratamento deve ser discutido com a equipe médica, cuja formação (onde estudaram?) e atualização se associam com a sua probabilidade de sobreviver. A auto-medicação ou as indicações de amigos e familiares podem ser letais. Procure seu médico.
Na minha cabeça, é nítida a relação entre a corrupção e a incompetência no setor público, de um lado, e o alto número de vítimas que poderiam ter sido salvas e não o foram e, olhando para o futuro, das que morrerão desnecessariamente. Com investimentos modestos muitas vidas seriam salvas. Se sairmos da análise de primeira linha e aprofundarmos a pesquisa, veremos que os grandes corruptos, sejam pessoas ou instituições, são assassinos de massas.

Gláucio Soares IESP-UERJ