Suicídios esquecidos

Muitos opinam sobre as taxas de suicídio. De tempos em tempos, lemos na mídia notícias alarmantes a respeito de uma “explosão” de suicídios no Brasil, num estado, numa cidade. Não existem. Desde que temos informações razoavelmente sistemáticas, 1979 a 2000, até o último ano a respeito do qual temos informações confiáveis, ainda que incompletas, o suicídio no Brasil tem seguido um caminho previsível. Partindo, em 1980, de 3,191, os suicídios no Brasil têm aumentado de maneira discreta e sistemática, na média 194 por ano. Para estimar o total do ano próximo, o melhor método é tomar como base esse ano e adicionar 194. O ajuste do número de suicídios ao tempo (medido em anos), segue uma função linear: a correlação ao quadrado entre o ano e o número de suicídios é 0,96, ou seja o R2, que expressa a percentagem da variância que se explica nos diz que conhecendo o ano explicamos 96% do número de suicídios no pais.

       
    O fenômeno, portanto é, estável e crescente. E, princípio nos concede uma grande vantagem na previsão e controle de um fenômeno semelhante que fosse instável.

    O suicídio é um problema de saúde pública mas, por tradição, tem sido um fenômeno de interesse sociológico, com nomes conhecidos, como o de Dürkheim, e com nomes esquecidos no nosso continente, como os de Adolphe Quetelet, André-Michel Guerry e Enrico Agostino Morselli. Aliás, não encontrei nas revistas das áreas de Sociologia (e de Ciência Política) um só trabalho de pesquisa sobre o suicídio no Brasil. Aliás, encontramos no Scielo Brasil apenas 171 trabalhos sobre suicídio sendo que apenas um em revistas sociológicas ou políticas que versava sobe…Dürkheim. Os brasileiros estão mais interessados no passado dos países da Europa ocidental do que no presente e no futuro do Brasil. É melhor, dá mais status parecer erudito e falar sobre Dürkheim do que ser pesquisador e buscar os determinantes dos suicídios no Brasil, e colaborar para reduzi-los. Os dados regionais do Scielo não permitem otimismo: há menos de quatrocentos artigos, incluindo muitas repetições.

As taxas brasileiras de suicídio são baixas, se comparadas à dos principais países da Europa ocidental e à de países conhecidos por suas taxas altas, como as pequenas repúblicas do Báltico. Mesmo tomando a América Latina como comparação, ficam abaixo das de vários países e muito abaixo das de Cuba, que é a campeã latino-americana dos suicídios.

         Muitos opinam sobre as taxas de suicídio; alguns pensam as regiões brasileiras como homogêneas: Sul, Nordeste etc. seriam internamente semelhantes. Não é assim. A violência suicida varia muito entre os estados e até dentro da mesma região. As tendências também variam. Não há perfil único nem tendência regional homogênea. Não obstante, há tendências nacionais, regionais e estaduais claras: as taxas brutas de suicídio cresceram linearmente desde 1979.

Olhando para todos os estados brasileiros vemos uma tendência demonstrada muitas vezes – os estados com taxas mais altas num ano tendem a ser os mesmos no ano seguinte, numa década tendem a ser os mesmos na década seguinte. Porém, não é uma situação estática – há variações. Dados para todos os anos sobre todos os estados brasileiros, permitem ver, com maior segurança, quais os estados nos que o crescimento foi mais acelerado e se houve muita mudança entre eles.

A análise das mudanças, para mais e para menos, permite verificar se há tendências de longo prazo, que varam diversas administrações, sem que elas façam diferença sensível, par a mais ou para menos, ou se elas mudam com uma determinada administração. Estudando essas mudanças e as políticas implementadas pelas diversas administrações, podemos ter uma boa idéia de políticas que deram bons resultados, que pioraram a situação e das que não alteraram a situação.

O suicídio, como diferente do crime em geral, e do homicídio, em particular, não tem sido objeto de preocupação dos administradores, sendo escassos os recursos e as políticas destinadas à sua redução. 


Escrito por Gláucio Soares


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